domingo, 14 de novembro de 2010

Branquitude acrítica e crítica: A supremacia racial e o branco anti-racista

Lourenço Cardoso

Na literatura científica de maneira geral as pesquisas sobre a branquitude têm se restringido em investigar a branquitude crítica, deixando de lado a branquitude acrítica. A branquitude crítica refere-se ao indivíduo ou grupo branco que desaprovam publicamente o racismo. Enquanto que a branquitude acrítica refere-se a branquitude individual ou coletiva que sustenta o argumento em prol da superioridade racial branca. Este artigo possui a preocupação em salientar a importância de distinguirmos a branquitude crítica e a branquitude acrítica. O que pode parecer apenas uma simples distinção pode nos levar a analisar com maior atenção e profundidade o crescimento e fortalecimento de grupos neonazistas e membros da Ku Klux Klan: grupos que representam dois significativos exemplos da expressão da branquitude acrítica.

Confira no link:
http://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=3235857

segunda-feira, 12 de abril de 2010

endoidar com segurança

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foste estúpido!

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que jamais
teve a coragem de ousar,
ou brincar

pessoa essa que vive
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o melhor momento para endoidar
com segurança


Lourenço Cardoso

Os contra-racistas versus os contra-racistas e a ausência do racista

Lourenço Cardoso
(Texto escrito em 2006 publicando In: PPPCor)

No Brasil, o projeto de lei de Cotas (PL 73/1999) e o Estatuto da Igualdade Racial (PL 3.198/2000) que será submetido a uma decisão final no Congresso Nacional suscitou o manifesto de “intelectuais” e militantes “a favor” e “contra” as políticas de ação afirmativa (políticas de AA).
Esse debate possui um aspecto curioso. Os dois manifestos se colocam contra o racismo, portanto, reconhecem a existência do racismo, e se posicionam como anti-racistas implicitamente e explicitamente.
É curioso que o debate sobre as políticas de ação afirmativa, ocorra somente entre as partes que são anti-racistas. Se ambos manifestos são anti-racistas, podemos concluir que eles apesar das posições antagônicas possuem o mesmo objetivo, o combate ao racismo. Aliás, esse é também um dos objetivos daqueles que argumentam “a favor” da aplicação dessas políticas.
Nesse debate sobre políticas públicas encontramos a presença do racismo. Ele é o ponto de convergência entre os dois manifestos. A divergência é a maneira de combatê-lo ao utilizar ou não utilizar as políticas de ação afirmativa. Um manifesto é “contra”, e o outro “a favor”, os dois manifestos foram suficientemente argumentados, e compete ao leitor tirar as suas próprias conclusões. Eu particularmente, posiciono-me “a favor” desse tipo de políticas.
Se existe um consenso entre os dois manifestos sobre a existência do racismo. Do mesmo modo, percebe-se nos dois manifestos a ausência de se problematizar o racista. Onde se encontram os racistas? Qual a posição dos racistas? Há racismos sem racistas?[1] O posicionamento contra o racismo elimina os racistas?
Se eu dissesse, que ser contra a política de ação afirmativa é a posição de um racista, acho que estaria sendo injusto, reducionista e insensato, por isso não digo. No entanto, não podemos fechar os olhos para os racistas brasileiros.
Acredito que esses racistas são provavelmente contra as políticas públicas que privilegiem os negros, eles são provavelmente contra discriminações, “discriminação positiva”, discriminação “a favor” de negros e “indígenas”. Esses racistas personagens ausentes desses dois manifestos, talvez, ao defenderem a idéia de que são contra as discriminações, alargam-na. Talvez argumentem que são contra todos os tipos de discriminações.
Sugiro que esses racistas são contra as políticas de ação afirmativa porque se é difícil encontrar no Brasil alguém que se declare racista, pior, será encontrar um racista a favor de políticas públicas destinadas aos não-brancos.
Talvez o racista, esse “ilustre ser ausente” desses dois manifestos, dessa discussão sobre o racismo, esteja presente em ambos os manifestos. Ao meu ver, o mais hipócrita, ou mais maquiavélico talvez seja o racista presente no manifesto contra as políticas de ação afirmativa.
Caro leitores, dito isso, de maneira nenhuma, pretendo insinuar que todos aqueles que são contra essas políticas são racistas, nada disso! De maneira nenhuma pretendo insinuar que os racistas escreveram um manifesto, que fez com que os anti-racistas reagissem. Nesse ponto, vale uma nota, geralmente, o negro anti-racista é reduzido a um sujeito que somente reage ao racismo branco, em outras palavras, esse negro seria incapaz de pensar e fazer qualquer outra coisa, que não fosse reagir ao racismo branco.
Caro leitores, assim como dizia, nem todos aqueles que são contra as políticas de AA são racistas, talvez, existam racistas a favor dessas políticas pelas suas próprias razões.
O estranho é que nesse debate contra o racismo suscitado pelas políticas de ação afirmativa, seja realizado somente entre as partes que reconhecem o racismo e se colocam explicitamente ou implicitamente contra o racismo. Estranha-me também o fato de que no debate contra o racismo, o racista seja um ilustre sujeito ausente. Há racismos sem racistas? Há racistas sem racismos? Porque se referir ao racismo e se calar quanto aos racistas?
Esse debate suscitado por esses dois manifestos sugere, que discutamos os estudos, ou realizemos novos estudos sobre o suposto racismo institucional praticado e reproduzido pelas universidades. Esse debate suscita pensarmos em maneiras de combater os racismos e os racistas. A política de ação afirmativa não seria em princípio uma proposta nesse sentido? Não seria uma alternativa para combater o racismo institucional acadêmico, entre outros racismos?
Parece óbvio, que podemos pensar, e debater outras alternativas, talvez pouquíssimas pessoas sejam contra debater alternativas, talvez, pouquíssimas pessoas sejam contra a melhora da qualidade do ensino público fundamental e médio. E desde quando as políticas de ação afirmativa são um impedimento para a melhoria da qualidade do ensino básico?
Melhorar a qualidade do ensino médio e fundamental é dever de qualquer governo, e uns dos nossos direitos fundamentais. Se a qualidade do ensino não vem ocorrendo as políticas de ação afirmativa não têm responsabilidades a esse respeito. Qual a contradição que existe entre a melhora do ensino público fundamental e médio e ao mesmo tempo aplicar as essas políticas? Alguém pode me explicar?
Se de um lado pensarmos que nesse debate sobre as políticas de ação afirmativa re-alimentado por esses dois manifestos, o que inquieta é a ausência da problematização sobre o racista, e a naturalidade com que não é percebida, ou referida essa ausência. Esse debate configurado como tal com essa ausência, penso que, já começa sob os alicerces da hipocrisia.
Essa ausência de se problematizar o racista é um dos indicativos dessa hipocrisia. E se o debate é feito sob os alicerces da hipocrisia, inevitavelmente corremos o risco de caminhar para manutenção do status quo. Manutenção do status quo que convém aos racistas, diga-se de passagem.
Por outro lado, podemos pensar que não é tão estranho assim: um debate contra o racismo realizado somente entre anti-racistas. Um debate com a ausência da reflexão sobre os privilégios do racista numa sociedade racista, afinal, ainda se escuta muito a frase: “aqui ninguém é racista!” E se ninguém é racista no Brasil, parece evidente que o debate sobre racismos seja restrito somente aos anti-racistas; anti-racistas esses com as melhores intenções.

[1] Santos, B. S. 2002. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. Revista Crítica de Ciências Sociais, 63: 237-280.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

A branquitude ressentida e Barack Obama

Barack Obama foi o primeiro presidente negro eleito nos Estados Unidos. Ele em sua campanha procurou desvincular sua imagem da idéia de raça. No jogo das identidades, apelou para sua identidade nacional, distanciando-se da identidade racial. O senador argumentou que era mestiço: filho de mãe branca americana e pai negro africano. A idéia implícita que o senador procurou passar durante o desenrolar da disputa eleitoral foi que a raça não era importante. Ele enquanto candidato ambicionou tanto os votos dos brancos, quanto dos negros, assim como todos os políticos, procurou angariar votos sem distinção.
Será que a raça não é realmente importante? Se a raça não fosse relevante por que o senador Barack Obama teve de enfatizar esse recado de maneira direta e inequívoca, e também muitas vezes de forma implícita? Talvez mais adequado seria o senador sustentar que a idéia de raça não deveria ser considerada relevante, ou seja, no sentido de ser um fator de vantagem e desvantagem.
Entre os negros norte-americanos a maioria votou em Barack Obama; negros que são pessoas distintas, inclusive pertencentes ao Partido Republicano, que disputou com o Partido Democrata do presidente eleito, que também teve a maioria dos votos dos latinos, isto é, voto étnico. Portanto o resultado apontado na apuração indicou o dado racial e étnico, como elemento significativo que influenciou a escolha.
Em sua campanha, quando o Barack Obama “falou”, ou se “calou” estrategicamente sobre sua pertença racial, sua intenção seria justamente de não perder votos porque é negro. Todavia, aceitou de bom grado os votos recebidos por causa de sua pertença racial. O presidente Barack Obama foi considerado negro aos olhos da opinião pública mundial, especialmente por causa das imagens e notícias veiculadas pela mídia, apesar do Srº Obama ter se esquivado dessa identidade racial, durante o decorrer de sua campanha.
A branquitude - que seria a identidade racial branca[1] -, sempre se vangloriou de sua condição de poder imanentemente superior, neste momento, com a vitória de Barack Obama a branquitude começa a tomar também para si o argumento de que a raça não é importante. Porém, se trata de uma branquitude ressentida que passa a sustentar esse discurso, porque não suporta ver, ou pior, ser obrigada a obedecer um negro que se encontra num nível hierárquico superior, daquele que ele historicamente sempre ocupou.
Por isso, neste momento, ouviremos muitas vezes da “boca” da branquitude o discurso: “de que o negro não seria negro”, “assim como branco não seria branco”, “mesmo porque a raça não existe”. Contudo no íntimo a branquitude ressentida, simplesmente não admite estar num patamar inferior ao negro. Até o presente momento na história norte-americana, nenhum presidente necessitou deparar-se com a idéia de raça presente e persistente a todo instante em sua campanha de forma direta ou indireta. Logo, o argumento de que a raça não é importante possui intenções diferentes, que dependerá muito da pessoa, ou grupo que o professa.
Nesta perspectiva da abolição do conceito de raça, destaca-se o intelectual Paul Gilroy[2]. Esse autor propõe o abandono da utilização política e analítica da idéia de raça, porque esse seria o melhor caminho para o fim do racismo, levando-se em consideração que a raça não deixa de ser uma idéia que o opressor inventou.
No caso da branquitude ressentida, a idéia de que a raça não existe seria defendida por causa da sensação de incômodo do branco, que entra em crise quando se depara com um negro num cargo de maior poder e prestígio, que é a posição que o branco sempre ocupou. A convincente vitória eleitoral de Barack Obama expõe essa branquitude ressentida. Nos Estados Unidos ela poderá ser encontrada expressa nos discursos dos brancos eleitores, ou simpatizantes do Partido Republicano que apoiaram o senador branco John MacCain.
O presidente “negro” (ou talvez “mestiço”), o Srº Barack Obama também expõe a branquitude revoltada, expressa na branquitude acrítica[3]. Essa branquitude acrítica refere-se aos brancos que não desaprovam o racismo publicamente como, por exemplo, os membros dos grupos neonazistas e da Ku, Klux, Klan, que já ameaçam assassinar Barack Obama. Simplesmente porque ele seria negro, ou, talvez, mestiço que possui uma parte negra, que seria para eles inaceitável. Mesmo porque eles seriam “brancos puros”, por isso, únicos cidadãos autenticamente estadunidenses.

[1] Acerca da branquitude confira: CARDOSO, Lourenço. O branco “invisível”: um estudo sobre a emergência da branquitude nas pesquisas sobre as relações raciais no Brasil (Período: 1957 – 2007). (Dissertação de mestrado), Faculdade de Economia e Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, 2008. Também CARONE, Iray e BENTO, Maria Aparecida da Silva (org.) (2002), Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Vozes.

[2] Acerca do fim da idéia de raça confira: GILROY, Paul (1998), “Race ends here”, Abingdon, Oxford: Ethnic and racial studies, vol. XXI, nº 5, 838-847.

[3] Acerca da branquitude acritíca confira: CARDOSO, 2008: 178-180.

Lourenço Cardoso

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Obama encontra finalmente o seu ritmo de governo na presidência

07/04/2010

Der  Spiegel
Klaus Brinkbäumer

Barack Obama desceu do seu pedestal e começou a governar com uma mistura de idealismo e pragmatismo. Os Estados Unidos perderam um pregador, mas o que não falta nesse país amargamente dividido são pregadores. Finalmente, 14 meses após a posse de Obama, os Estados Unidos contam com o presidente reformista do qual o país necessita.

Passados 14 meses desde a posse de Obama, os norte-americanos finalmente têm um presidente. Eles perderam Santo Barack, o pregador mundial.

A ascensão dele foi ofuscante, e isso era parte do problema. Essa ascensão foi tão irreal quanto a chegada de um salvador. Foi uma ingenuidade, mas Obama fez uma campanha eleitoral ingênua: nós podemos mudar, eu darei a vocês um governo que cura.

Essa abordagem logo fracassou, porque o mundo real jamais é ingênuo.

Agora a esquerda nos Estados Unidos diz que Obama traiu não só os ideais dela, mas os do próprio presidente, afirmam que ele cedeu demais e foi muito brando, acusam-no de ser um professor na Casa Branca, um homem impotente, um Jimmy Carter negro. Já a direita vocifera que ele traiu os princípios norte-americanos e o vê como um comunista e um esbanjador do dinheiro do contribuinte. Isso o enfraqueceu. O governo israelense está se preparando para ignorar o presidente problemático até que os norte-americanos escolham um outro candidato para ocupar a presidência. O presidente afegão Hamid Karzai permite que o seu convidado de honra – o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad – fale mal dos Estados Unidos enquanto soldados norte-americanos protegem Cabul. Mas isso também provavelmente passará: o mundo real não é uma caricatura.

Estas são as semanas do retorno de Obama. Após a sua aparição e crucificação, nós estamos presenciando um processo de secularização. A Casa Branca está se reajustando e encontrando o seu equilíbrio. A reforma do sistema de saúde, finalmente aprovada, deverá fornecer cobertura a 32 milhões de cidadãos e representa uma vitória de Obama sobre o establishment de Washington que há anos é marcado pela paralisia congressual.

Obama deu continuidade a sua tendência a preencher cargos importantes por decreto presidencial. A seguir houve o avanço nas negociações para desarmamento com a Rússia, e depois disso ele seguiu para o Afeganistão. O que estamos presenciando é um início atrasado de ação por parte do presidente.

Um país agressivo e dividido

Todo mundo sabe que existem dois Estados Unidos. Franklin Delano Roosevelt era detestado por milhões de pessoas, Kennedy era odiado pela direita, Nixon pela esquerda, Clinton pela direita, Bush pela esquerda. Os Estados Unidos são um país agressivo. Às vezes isso faz dele um país dinâmico, outras vezes um país destrutivo.

As diferenças entre norte-americanos e europeus são maiores do que muitos europeus pensam. Para os norte-americanos conservadores, o consenso europeu de que um governo forte tem que ajudar os fracos é um ataque à liberdade. Para a direita norte-americana, “solidariedade” e “social” são palavras do vocabulário de provocadores.

Obama tentou modificar esse clima fazendo pregações sobre dever e responsabilidade, e obteve o resultado oposto: paranoia. Teorias conspiratórias e exageros pairavam sobre as entrevistas televisivas do presidente. E além disso houve o movimento Tea Party, e todas as advertências quanto a imigrantes, moradores das grandes cidades, intelectuais, pesquisadores do clima, ativistas da campanha contra armas, políticos, mulheres e negros – em suma, tudo o que ameaçaria os valores norte-americanos básicos.

Os Estados Unidos são um país complicado que passa por uma onda de mudança demográfica que o tornará ainda mais complicado. Nas próximas eleições, os Estados Unidos branco ver-se-á praticamente impossibilitado de vencer os negros e os imigrantes hispânicos caso esses dois blocos juntem forças. A classe média branca teme essa mudança e está nervosa. Senadores são alvos de cusparadas, Sarah Palin aconselha os cidadãos a “recarregarem”, as milícias se armam. O jornal “The New York Times” falou de uma “imitação em pequena escala da Noite dos Cristais”.

A profundeza do abismo não tem precedentes, e também é sem precedentes o fato de a direita estadunidense não ver mais Obama como o seu presidente. “Esse sujeito negro é o seu presidente” - sentenças desse tipo são uma novidade.

É claro que é possível governar em tal clima, mas não será um percurso suave. Um dos maiores erros de Obama foi acreditar na sua visão messiânica de uma presidência que transcenderia as linhas partidárias. Agora ele está governando com paixão, estrategicamente e com cabeça fria.

A democracia não exige harmonia, ela não exige sequer consenso. Tudo o que ela necessita é de uma maioria. Obama desceu do seu pedestal e ao que parece pretende seguir implementando reformas nos quase três anos de presidência que ainda tem pela frente. Um governo meio à esquerda, com um pouco de idealismo e uma dose de pragmatismo, se necessário.

Tradução: UOL

(Fonte: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/derspiegel/2010/04/07/obama-encontra-finalmente-o-seu-ritmo-de-governo-na-presidencia.jhtm)