segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Ele evoluiu tanto a ponto de escrever a frase racista

Lourenço Cardoso
(texto escrito em 1999 publicado In: PUC-VIVA,
APROPUC-FAPUC, São Paulo)



“Negros, voltem para a selva, seus primatas”. Esta frase foi escrita, no banheiro da faculdade de Ciências Sociais por alguém que certamente está incomodado de ver tantos negros na PUC-SP. Quantos negros serão? Provavelmente menos de um por cento do total de alunos. É inegável que é muito pouco, estes poucos incomodam... Para os racistas é um absurdo negro estudando. Esta não é a função do negro, a sua função é “limpar o que o branco sujar”.
O professor Leonardo Trevisan, formado em história na USP, em seu livro Abolição um suave jogo Político? Desenvolve esse tema no capítulo chamado: “Por que ‘negra é’ a mão que faz a limpeza ?.” O geógrafo Milton Santos assegurou: “a universidade é o lugar para pensar”. Se for assim, o que os outros negros fazem lá? “Esses que teimam em não limpar”. Será que esses poucos negros estão indo estudar?
A universidade, segundo alguns professores universitários, “é o lugar da excelência”. Se a universidade é “o lugar da excelência para pensar”... entendo a preocupação do racista ao escrever: “Negros, voltem para a Selva, seus primatas”, racista cujo nome não citarei porque ele não assinou.
Ele ao escrever talvez estivesse querendo lecionar antropologia, talvez estivesse querendo dizer que existe a hipótese de que o homem saiu da floresta para a savana, e evoluiu... Talvez ele queira dizer que os negros saíram da floresta e não evoluíram... Talvez ele seja branco e queira dizer que os brancos, ao contrário dos negros, evoluíram. Talvez ele queira dizer que ele [branco] evoluiu tanto a ponto de escrever a frase racista.
Frase que para a maioria não tem a menor importância, é um ato de vandalismo, que me faz lembrar as frases semelhantes contra os judeus que resultou na morte de aproximadamente seis milhões de judeus. Fato que levou muitos a dizerem “pobre dos judeus”, e ninguém se lembra dos negros e nativos. Quantos morreram? 40 milhões... 400 milhões?...
Existem muitos pesquisadores brancos estudando o negro, “o negro é pertinente”, o negro é um “objeto de pesquisa excelente”. Esses brancos de tanto estudarem tornam-se autoridades no assunto, a ponto de dizer ao negro quando ele é vítima de racismo. Chico Buarque quando canta “Eu quero lhe dizer que a coisa aqui tá preta” na música Meu Caro Amigo (que compôs em parceria com Francis Hime) para alguns doutores não pratica racismo, afinal ele é “unanimidade nacional”.
Apesar de que, para os doutores, talvez não exista unanimidade para Nélson Rodrigues: “Toda a unanimidade é burra”. O mesmo Nélson que comentou com Abdias do Nascimento, na época em que escreveu Anjo Negro: “No Brasil o negro é pior tratado do que nos Estados Unidos” relatado em Anjo Pornográfico de Ruy Castro onde aparecem frases como esta (da página 393): “Por que Nélson ajudaria alguém acusado de ‘denegrir’ o Brasil no exterior? E ainda mais que esse ‘negrume’ se referia às torturas”. É preciso perguntar aos doutores se Ruy Castro foi racista nesta frase. Eles que se dedicam anos e têm como objeto de pesquisa o negro. Para o mercado os negros não são “seres humanos”, são consumidores. Para esses estudiosos brancos, o negro também não é um “ser humano” é “objeto de pesquisa”.
O sociólogo Florestan Fernandes (numa reportagem à Folha, em 20 de Agosto de 1995 a dez dias antes de sua morte) comentou a Integração do negro na sociedade de classes: “A integração... é o trabalho mais importante que fiz, tanto em termos empíricos quanto teóricos. O título já é dialético que fala de uma integração que não houve”. Um dos colaboradores do Florestan nesse livro foi o José Correia Leite, a quem Florestan prestou uma homenagem na Câmara dos deputados, em 20 de Março de 1989:
“José Correia Leite homem de origem humilde, batalhador, negro, que foi um dos pioneiros dos movimentos sociais que se organizaram em São Paulo para desmascarar a situação que viviam os negros”. - Acrescentou: “José Correia era modesto, mas realizou tarefa intelectual e política de um grande homem, aliás, de um grande homem em escala nacional[1]”.
No livro E disse o Velho Militante, do escritor Cuti, há uma frase de José Correia Leite que serve aos brancos que se julgam especialistas: “Não estou discutindo títulos e sim idéias”. O doutor imbeciliza-se quando afirma ao negro com a autoridade do seu título: “Isto não é racismo, você está com complexo de perseguição”.
Quanto à frase racista hipoteticamente arriscarei uma estatística. Vamos supor que: “ a cada ‘50’ brancos ‘3’ negros vejam a frase. Desses ‘50’ brancos, uns ‘2’ amigos de ‘preto’, não aprovem a frase e até comente com seu colega ‘preto’ que ele deveria tomar providência. Dos ‘3’ negros para ‘50’ brancos, se ‘1’ negro se indignar ao ler a frase racista, será um fato extraordinário...”
Pois o branco mandou o negro não se importar quando negam sua integridade humana. Não foi esta a ordem? Se a cada “3” negros ao lerem a frase racista somente “1” esporadicamente fica indignado, parece óbvio que a ordem é essa.
Os negros universitários decepcionam-me porque são muito obedientes aos brancos. Eles saem da periferia pagam uma, duas ou mais conduções, chegando na universidade não estranham o fato de praticamente não existirem negros. Eles ignoram Milton Santos para eles a universidade não é “lugar para pensar”, eles estão lá para ascender socialmente, para se integrar, para namorar e, “se deus quiser”, casar, assim seus filhos nascerão mais claros, e certamente terão uma vida melhor. Gil e Caetano na Música Haiti cantam: “Todos sabem como se tratam os pretos”.
Viver no ostracismo não dá, o melhor é se “integrar”, ouvir piadas racistas e rir, “pois o branco manda rir”. Eles repetem discursos: “Os negros que não chegam as universidades são preguiçosos”.
A Educafro - Educação e Cidadania para afro-descendentes e Carentes adaptou um documento que denominou: SETE ATOS OFICIAIS QUE DECRETARAM A MARGINALIZAÇÃO DO POVO NO BRASIL. Para se ter uma idéia cito apenas dois deles:
“O 2º Ato Oficial: Lei ‘Complementar à Constituição de 1824’ que impedia os negros de freqüentar escolas, pois eram considerados doentes de moléstias contagiosas e o ‘4º Ato Oficial, sobre a Guerra do Paraguai (1864 - 1870)’ que foi um dos instrumentos para reduzir a população negra do Brasil.”
Nem todos repetem esses discursos. Existem negros dedicados em estudar o negro. Esses negros ficam felizes quando aparece outro negro na universidade, se preocupam em despertar sua “consciência racial”, fazem amizade e logo profetizam: “você tem que ler os livros!”
O negro, feliz, querendo se informar diz: “Que ótimo! Empreste-me”. Esses negros recusam, temem que seu livro seja roubado, e pede para o “mano” tirar cópia, o “mano” não tem dinheiro. Esses negros universitários são “conscientes”, afinal lêem em excesso a ponto de esnobarem: “se você quiser falar comigo tem que ler”. Esses negros provavelmente não conversam com seus “manos” das periferias onde moram, sobrando-lhes os poucos negros universitários “conscientes”, e alguns brancos, que apesar de serem esmagadora maioria da universidade, poucos são os que lêem.

[1] Florestan Fernandes “Significado do Protesto Negro”

2 comentários:

  1. Olá, com o máximo de curiosidade e sem outra intenção, gostaria de saber por que a etnia negra, enquanto civilização na mãe África, não parece ter progredido como os Maias, Astecas e outros povos Europeus? Ou será que informações não nos foram repassada corretamente sobre a civilização negra na África?

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  2. Atualistas...

    A civilização Egípcia (africana) foram uma das maiores civilizações da história, de tremanda organização social e cultural, impressionantes para época, inclusive sendo eles, conforme é defendida em uma teoria específica, os grandes percurssores de monoteísmo e também da sociedade européia moderna como conhecemos hoje (visto que, estudos dizem que tal qual o monoteísmo, como quanto muita de sua concepção de sociedade, foi absorvida pelos gregos quando os mesmos tiveram seu período de dominação para com o país)

    Lembrando-se que em uma época há milhares de anos, quando a maioria do povo europeu era nômade e vivia em tribos, o Egito já se emergia como grande potência mundial para época.

    Há um artigo meu que questiona o conceito de Darwinismo Social, que disserta um pouco sobre este ponto.

    http://livrespensadores.org/artigos/darwinismo-social-is-bullshit/

    Lembrando que países africanos como a Líbia possuem IDH (0,755) mais altos do que países europeus como Rússia(0,719), Ucrânia(0,710), Turquia (0,683), entre outros. Estão na frente até de nosso país com IDH de 0,699.

    Espero ter ajudado cara,
    Abraços!

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